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Memórias Sombrias - Esther (2)

INTERLÚDIO - Residência dos Wright, São Francisco (US-CA) (19 de setembro, 2014 D.C.)

Alguns dias depois, um silencioso jantar em família na Residência dos Wright selaria definitivamente o destino daquela família.

— Precisamos conversar, Esther — disse George Wright.

— Pode falar, papai.

— Não espero que você entenda, mas, vou ter que te tirar dessa escola.

— O quê!? Como assim!?

— O CFE não é digno de uma princesa. Você não pode estudar em uma escola comum.

— Mas, essa não é uma escola comum, é uma escola de elite! A melhor do país!

— Isso não é o bastante! Você precisa de professores particulares! Professores dignos da princesa que você é!

— Mas, eu tenho tantos amigos lá…

— Uma princesa não precisa de amigos!

Enquanto Esther e George discutiam, David observava atentamente.

— Mas…

— Não discuta comigo, filha! Já está decidido.

— Eu… Eu…

— O quê?

— Eu só queria que você me contasse a verdade, papai.

— Como assim?

— Eu sei que esse não é o verdadeiro motivo. Por que você quer me tirar da escola?

— Filha…

— Conta pra mim.

— Nós somos pessoas importantes, filha. Podemos ser mortos a qualquer momento. Eu só não quero que você acabe como sua mãe.

— Mas, a mamãe se matou papai.

— Não diga isso, filha. Ela não tinha motivos para nos deixar assim.

— Mas, os remédios…

— Ela pode ter sido envenenada! Eu tenho certeza que aquilo tudo foi forjado!

— Mas, só tinha a gente em casa.

— É por isso que precisamos tomar cuidado. O perigo sempre está à espreita.

— Isso que você tá falando não faz nenhum sentido.

— Confia no papai, filha. Amanhã eu vou começar uma grande obra aqui em casa. Vou criar corredores, salas vazias, portas secretas, portas que não levam a lugar nenhum e integrar tudo com o Nexus. Ninguém vai conseguir nos caçar, nem dentro da nossa própria casa. Eu vou nos proteger!

— Mas, pai…

— Eu vou chamar seu tio David pra morar conosco também. Assim ele fica mais seguro. Confia em mim que vai dar tudo certo, filha.

— O tio David?

Nesse momento, David decidiu se pronunciar.

— Pô, você é um estraga prazeres mesmo hein, George. Eu tinha pensado em uma surpresa incrível pra ela!

— Surpresa!? — Esther gritou.

— É, isso aí! — diz o homem, tirando uma sacola que estava debaixo da mesa.

— O que é isso?

— Esse é um ursino de pelúcia que eu comprei pra você. Sabe como é, né? Eu não posso morar aqui se não tiver a benção da princesa que manda nesse castelo.

INTERLÚDIO - São Francisco (US-CA) (21 de novembro, 2022 D.C.)

No dia vinte e um de novembro de dois mil e vinte e dois, enquanto Esther dirigia seu carro de volta para casa, o seu celular tocou.

— Alô?

— Oi, como você tá amor? — disse Jessica ao telefone.

— Ah, tô dirigindo, não sei se é uma boa hora pra gente conversar.

— Desculpa, eu só queria ouvir um pouco sua voz.

— Ah, para… Você não é tão sentimental assim. A gente acabou de se ver.

— Poxa, acho que isso é verdade. — disse Jessica em tom de risada. — Mas, sei lá, queria conversar um pouco.

— O que foi, hein?

— Só tava pensando em quão incrível foi passar o dia com você e do quão animada eu tô para o nosso casamento mês que vem.

— Tenho certeza de que você não está tão animada quanto eu. Mas, te falar, tem alguma coisa errada, Jessica? Você não costuma ser tão carinhosa assim.

— Ah, você acha? Desculpa, então. Melhor mudarmos de assunto.

— Certo.

— Viu o que tá passando no noticiário nessa última semana? Um rapaz que tem quase a nossa idade teve toda sua família morta pelo pai.

— Nossa, que horror. Os assassinatos tem aumentado muito ultimamente.

— É mesmo. O pai era funcionário da EDEN e pelo visto surtou no caminho pra casa. O filho tava na faculdade e encontrou todo mundo morto quando voltou.

— É horrível passar por uma situação como essa. Sabe do que isso me lembrou?

— Da sua mãe, né?

— Pois, é. Acho que hoje entendo melhor o que aquilo que ela dizia significava. Todo esse lance de princesa é um saco, e acho que não levo jeito pra coisa.

— E o seu pai? Como ele tá?

— Sinceramente, mesmo que tenham se passado treze anos, ele nunca mais foi o mesmo. Foi um trauma muito grande para o meu pai, e ele continua com aquela paranoia de que nossa família tá sendo perseguida.

— Acho que faz sentido ele se sentir assim.

— A minha mãe estava doente e eu não fui capaz de ajudá-la. Espero que as coisas sejam diferentes agora com ele.

— Serão.

Assim que finalizou a ligação, Esther entrou na mansão e colocou seu carro na garagem.

— Cheguei, pai. — Ela gritou.

Esther subiu as escadas e abriu a porta da residência. Porém, ela foi surpreendida pela presença de seu tio, que estava com o corpo ensopado de suor.

— Esther, você não faz ideia do que aconteceu! — disse David em desespero. — Eu não sei o que fazer!

— Calma, tio. O que houve?

— Esther, o seu pai desapareceu!

— Desapareceu!? Como assim desapareceu!?

Duas semanas se passaram e George Wright não foi encontrado. Porém, a polícia encontrou um pedaço de sua mão esquerda no jardim da mansão, o que serviu de base para constatar sua morte.

INTERLÚDIO - Baker Beach, São Francisco (US-CA) (1 de março, 2025 D.C.)

Na noite de primeiro de março de dois mil e vinte e cinco, três anos depois do desaparecimento de seu pai, Esther visitou a velha Baker Beach, onde ela e sua família costumavam passar um tempo juntos.

— Amor, vamos pra casa, tá começando a chover. — disse Jessica.

— Pode ir pro carro, eu tenho que passar mais um tempo aqui.

— Escuta aqui, Esther! Pra mim já deu! Você não se enxerga, não?

Apesar do insulto de sua esposa, a mulher brega continuou olhando fixamente para a areia em silêncio.

— Olha só pra você! Você passou os últimos três anos tentando encontrar o assassino do seu pai e não conseguiu nada! Você tá ficando louca igual a ele, obcecada por esse crime.

— A situação é diferente agora. O meu pai foi assassinado.

— Não é não! Se a polícia desistiu de procurar pelo assassino, por que você vai continuar investigando por conta própria!?

— Alguém molhou a mão daqueles policiais, Jessica. Não faz sentido eles terem desistido de procurar tão rápido assim.

— Escuta, Esther, o país quebrou. Tem pessoas andando armadas pelas ruas lutando umas com as outras pelo tal Quociente de Laplace, que elas nem sabem se é real! Você tem noção da nossa situação!? Todo mundo ficou maluco e nem tem mais polícia!

— Isso é o que menos importa agora. Tenho certeza de que meu pai faria o mesmo por mim.

— Seu pai passou mais de dez anos tentando encontrar um assassino para a esposa dele, um assassino que nunca existiu! Você pode ser diferente!

— Você não entende, Jessica. Eu falhei como filha.

— O seu pai era um chato! Você deveria estar comemorando que agora está livre! Não tem mais ninguém pra você agradar. Pode fazer o que quiser, viver como quiser, se vestir como quiser.

— Ele era meu pai, porra! Era especial pra mim!

— Mas…

— Minha mãe me ensinou que a coisa mais importante na vida é a família, então tenho que pelo menos conseguir fazer justiça.

— Eu não sou sua família!? Você cancelou nossa festa, nossa lua de mel e nós quase não passamos tempo nenhum juntas! Você quer acabar com o nosso casamento!?

— Me desculpa por isso.

— Não peça desculpas, pare a investigação!

— Não posso…

— Eu não quero te perder, Esther!

— Se pra vingar meu pai eu tiver que mergulhar nesse mar de insanidade, eu vou mergulhar de cabeça, mesmo que eu morra afogada no final.

— Droga! Você vai se arrepender disso, amor…

Então, depois que Jessica voltou para o carro, Esther retirou seu tênis rosa choque, colocando seus pés na areia. Em seguida, ela pegou uma pedra chata do solo e arremessou contra a água, fazendo-a quicar sete vezes.

— Parece que eu finalmente te superei mãe — disse Esther, olhando para a água com um sorriso de satisfação.

Após isso, a mulher brega voltou para o carro e dirigiu-se de volta à sua casa.

— De quem você suspeita agora, Esther?

— Eu passei três anos tentando evitar pensar nele como um suspeito. Mas, com as últimas pistas, tudo aponta para o meu tio David. Espero estar errada, de verdade…

— Entendi… E o que você vai fazer?

— Vou verificar o escritório dele amanhã, porque hoje tô com uma preguicinha…

— Poxa, você parecia tão determinada antes…

Chegando em casa, as duas mulheres entraram no quarto rosa de Esther.

— Olha, Jessica, eu sei que fui grossa com você lá na praia. Mas, eu quero saber se você ainda tá a fim de ver o eclipse de hoje comigo, se a chuva permitir, claro.

— Pode ser, mas, acho que mereço uma recompensa antes. — diz Jessica jogando Esther sobre a cama.

— Pera aí, o que você tá planejando!?

— Você foi uma menina muito malcriada, então merece uma punição adequada.

Em seguida, Jessica amarrou Esther em sua cama e utilizou um pano preto para vendá-la.

— Uau, assim você me deixa curiosa!

— Só relaxa, porque eu vou matar sua curiosidade rapidinho.

Repentinamente, Esther ouviu três tiros sendo disparados, um após o outro.

— O… Quê!?

— Eu sinto muito…

— Como assim sente muito, porra!?

Então, Esther sentiu o cheiro de sangue e um calor percorreu todo seu corpo, seguido de uma dor insuportável.

— Você… Não…

— Eu não podia deixar você chegar perto do David.

— Sua… Filha da pu… — Ela tentou gritar, mas o sangue já estava em sua boca.

Após ouvir o som da porta batendo, Esther sangrou até a morte.

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— Caralho? Então, significa que… Eu tô morta? Mas, como? — diz Esther olhando para si mesma. — A Bruna tem que saber disso…

— Você não tem mais nada, Esther. Nem seu pai, nem sua esposa, nem a si mesma.

— O quê? Não, não, não!

— Eles tiraram tudo de você. Fizeram isso para que você estivesse sujeita aos seus ideais narcisistas e hipócritas. Para que você se tornasse uma casca vazia, apenas uma máquina de matar pessoas.

— De quem é que você tá falando!? Quem é você, caralho!? — grita Esther com lágrimas em seus olhos. — Ué, isso são… Lágrimas?

— Você precisa rejeitar essa nova vida, voltar para o outro lado, de onde você nunca deveria ter saído.

— Nova vida?

— Humanos não podem renascer. A sua existência contradiz as leis da natureza e vai causar uma catástrofe. — diz a mulher, entregando uma adaga para Esther. — Faça o que deve ser feito.

A adaga possui uma lâmina escura, com rachaduras que brilham em um forte azul-escuro.

— Calma, é informação demais pra digerir. Eu tenho que pensar.

— Você precisa decidir agora.

— Mas…

— Decida!

— Eu… Eu… Eu não posso fazer isso.

— Não! Você não entende! — grita a mulher, pegando Esther pelo braço.

— Posso ter perdido tudo da minha antiga vida, mas isso não importa. Só o presente importa! Nesse momento, tem duas pessoas muito especiais esperando por mim. Então, eu tenho que voltar!

— Como consegue dar tanto valor a pessoas que acabou de conhecer!? Será que vão estar te esperando quando voltar!? Se ainda estiverem vivos, provavelmente já devem ter te abandonado na mansão.

— Eu vou voltar e vou salvá-los, independente da situação!

— Você é idiota!? — diz a mulher apertando ainda mais o braço de Esther. — Você não entende o que está em jogo! Essa é uma quebra total do equilíbrio!

— Não, a minha vida não é uma quebra do equilíbrio. O equilíbrio já foi quebrado há muito tempo…

Então, Esther segura firme sua adaga e esfaqueia a testa de sua similar, fazendo-a desaparecer lentamente na escuridão.