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2.8

O som estridente do portão e agudo do metal fechando ressoou assim que que Nott o empurrou até o fim. O cavaleiro era o último a seguir atrás de seu jovem mestre, seu amigo e de seu companheiro de ordem. Um suspiro escapa de seus lábios e a expressão muda para uma séria, como a que um cavaleiro deveria ter em seu local de trabalho. Ele queria dizer para o Miller sobre o que teria falado no casarão, mas pensou que seria melhor quando estivessem chegado ao menos na propriedade.

Sob os raios de sol, Brandon fitava as costas de Ferion, perguntando-se qual seria a tática que empregariam no orfanato para prenderem e punirem o diretor. Era óbvio que tinha algo estranho e havia muitas irregularidades para não terem notado, principalmente porque seu trabalho no local era, especificamente, fazer uma averiguação. Porém, o nobre saiu dali muito rápido, não dando muito o que investigar. Somente algum tempo, menos de uma hora até, estiveram lá dentro. Mas ele tinha certeza que se fosse dito para fazer uma procuração de pistas com os cavaleiros da família, rapidamente encontrariam provas. As crianças, principalmente, seriam testemunhas e provas o suficiente. 

Era claro para qualquer um que elas eram as vítimas e que sabem em primeira mão o que acontece naquele lugar.

Brandon simpatizava com elas e não conseguia mudar isso, ainda que seu rosto não expressasse tal sentimento. Só pelos seus olhos verdes exuberantes era possível distinguir isso, e se o observasse com muita atenção. Ele não queria que elas sofressem mais do que deveriam, por causa de como a sociedade os marginaliza. Ele faria o que pudesse nessa investigação para que o homem pudesse sair dali. 

O ruivo entrou na carruagem e sentou-se de frente a Ferion. A carruagem começou a andar sem nenhum aviso, mas nenhum dos dois estranhou tal fato. O silêncio durou por algum tempo, antes de Ferion abrir a boca repentinamente.

"O que você achou delas?" 

Brandon direcionou sua atenção para Ferion, vendo os cabelos negros e o rosto bonito dele, olhando para ele. A luz que entrava pela janela iluminava o chão e parte do banco. Os olhos negros estavam como sempre. Ele achava que era apenas como seu rosto era no final das contas. 

"Elas?"

"As crianças." 

"Ah." Brandon exclamou. No entanto, ficou em silêncio não sabendo o que responder imediatamente. "... Elas pareciam nervosas."

"Sim, também achei." Ferion assentiu, concordando com sua afirmação. "Mas não acho que tenha sido por causa da gente."

"Elas estavam com medo dele, não era?" Brandon perguntou, para confirmar sua hipótese. Era algo que tinha certeza, mas era bom confirmar com outra pessoa, ainda mais com o responsável pelo trabalho em si.

"Você notou." Ferion sorriu. Brandon queria lhe dizer que era impossível não notar. 

As crianças estavam nervosas e era visível para qualquer um. Quando se é jovem, não tem tanto controle de suas emoções e acabam sendo expostos para quem quiser ver. E com elas não foi diferente. Ainda que fosse mais discreto do que deveria, ainda era fácil de descobrir para o que, ou melhor quem, olhavam. Sua atenção estava um pouco menos neles do que no homem que estava próximo a porta o tempo inteiro daquele horário.

"Acha que ele fez alguma coisa com elas? Para mim, ele parecia capaz disso." Sua testa quase franziu um pouco, com a lembrança daquele homem os olhando de maneira fria na primeira vez que se viram. Aqueles olhos eram hostis a qualquer um que encontrasse. Tão cortante quanto um fio de uma espada afiada. Não eram olhos que deveriam ser direcionados a crianças.

"Algumas delas estavam com roupas de manga longa." A expressão de Ferion se aprofundou ao dizer isso. 

"Também achei isso estranho. Quem usaria tal roupa em pleno verão? Está quente e próximo ao meio-dia e faltam meses até que o clima esfrie. Isso só quer dizer uma coisa…" Brandon não terminou de falar. Ambos sabiam o que aquilo poderia significar. Um suspiro cansado saiu de seus lábios. "Bem… O que vamos fazer? Tem alguma ideia, Ferion?"

"Acho melhor informar primeiro a meu pai sobre o assunto. Ele tem que ter consciência do que está acontecendo em seu território." Ferion disse e bateu três vezes em seu joelho. "Também tenho que ouvir o que o cavaleiro tem a dizer…"

Brandon o olhou de maneira mais atenta. O único cavaleiro que havia tentado falar algo enquanto estavam no orfanato era Nott. 

"Você quer dizer Nott?"

"Esse é o nome dele? Se for ele, então sim." Ferion respondeu. Sua curiosidade surgiu, com a facilidade que o nome do homem foi dito por Brandon. "Você o conhece? Vocês pareciam amigos quando se viram no portão."

"... Sim, o conheço. E somos amigos também." 

"Ele é novo, não é? Nunca o tinha visto antes. E ele parece muito jovem também." Ferion comentou. "Como o conheceu?"

"Ele está apenas há um ano na propriedade." Brandon o respondeu. Quer dizer que ele era recente, que entrou depois dele ter partido. "Ele havia se perdido e acabou me perguntou por onde era o caminho. Depois continuou puxando assunto e ficou falando sozinho, enquanto apenas escutava."

Brandon ficou um pouco constrangido de dizer isso para ele. Não era como a vergonha de fazer que não queria ser descoberto, mas, sim, de não querer demonstrar uma parte sua que não gostaria que os outros vissem. Ele não gostava de deixar claro que ele não gostava de falar com estranhos, quando não envolve nenhum meio profissional ou quando ele não os aborda primeiro.

Brandon ainda se lembrava de que quando o conheceu, Nott, o recém-nomeado cavaleiro, na época, pediu-lhe informações e ele o disse que lhe mostraria. Só tinha dito poucas palavras, para segui-lo, e não falou mais nada até a despedida. Não era algo profissional, mas ele não iria deixá-lo por ali, quando poderia mostrar-lhe e não demoraria muito. Porém, foi um pouco desconfortável vê-lo puxando assunto com ele diversas vezes e ele não responder nada para o rapaz mais novo que ele.

Ele pensou que Nott teria o visto como arrogante ou algo do gênero, era algo que poderia conviver. Mas, inesperadamente, ele relevou isso e continuou puxando conversa quando se encontraram algumas vezes depois. E isso resultou na amizade que eles tinham atualmente.

Ferion piscou com a frase dita por Brandon e como seu rosto não demonstrou nada em particular ao contar tais fatos. 

"Então vocês ficaram amigos por causa disso." Balançou a cabeça, supondo o que aconteceu depois. "Fico feliz que você tenha com quem conversar na propriedade, além de mim, James e a mãe."

Brandon o olhou, perguntando-se porque o homem à sua frente estava incluso. Mas, dado que eles estavam juntos esses dias por causa do trabalho, era natural que ele se colocasse na lista. Além disso, era estranho ouvir isso de alguém que você mal teve contato nos sete anos e que se sentia meio intimidado, ainda que não fosse de propósito. Bem, também não era como se não tivesse nenhum relacionamento com o pessoal da mansão, eram seus colegas de trabalho e ele tinha uma história com eles de qualquer maneira, visto que trabalhava no condado há anos, só não eram amigos. Talvez fosse isso que o nobre estivesse falando, no fim.

"Sim, também fico." Brandon ergueu um canto do lábio belamente.

'Nott é realmente um ótimo amigo…' 

*

O sol os saudou assim que eles desceram da carruagem. Brilhante e de cor amarela, era clara a luz que irradiava a manhã e naquele começo de tarde. Eles chegaram um pouco mais tarde do que planejaram, pois Ferion pediu para que parassem em um restaurante para eles almoçarem, visto que eles só tomaram o café da manhã antes de saírem. Brandon não foi contra, também estava com fome.

O ruivo encarou a mansão, imponente e de cores neutras, que havia ali olhou em volta brevemente na visão familiar, antes de voltar sua vista para Ferion que estava liberando o cavaleiro e caminhando com a mesma expressão habitual em seu rosto. O único detalhe que ele teve que se destacar era que Nott o estava seguindo por trás. Parecia que ele, Ferion, o havia ordenado para que os seguisse para terem a conversa sobre o que Nott teria falado no edifício do orfanato.

Brandon estava um pouco curioso sobre isso também. Ele não esperava que Nott se apresentasse e tentasse falar alguma coisa ali, ainda mais para Ferion, o qual era seu superior e sem o mínimo de contato. E também, sobre o que ele falaria, pois era evidente que seria sobre o orfanato e as pessoas que vivem ali. Talvez fosse até sobre o homem de cabelos e bigodes brancos que tinha sua antipatia somente por existir.

Uma porta de madeira com uma placa de metal prendida na porta foi aberta pelas mãos com calos de Ferion. O ambiente que se revelou era moderadamente grande e com duas estantes de livros, um arquivador e uma mesa no lado oposto à porta. Era um escritório. O escritório de Ferion. Ele ficou pronto algum tempo depois dele ter chegado à mansão, mas faltava preparar alguns móveis, pois não bastava somente limpar a sala. No entanto, foi feito rapidamente e não havia necessidade de pressa, já que Brandon e ele estavam tendo um bom ritmo no quarto dele.

Ferion caminhou até sua mesa de carvalho e deu a volta, sentando-se em sua cadeira acolchoada de cor verde escura. Suas costas logo se encostaram nas costas da cadeira e ele olhou para Nott com uma expressão séria e intimidante. Uma aura opressora e que causava medo e nervosismo nos outros poderia ser sentida levemente na atmosfera por Brandon. Nott, no entanto, sentia ela com um pouco mais de precisão e intensidade do que o ruivo que estava parado ao lado do jovem mestre da casa.

Nenhum deles falou nada durante o restante do caminho até ali e continuou em silêncio ao estarem ali dentro.

Nott estava nervoso com o rumo que a conversa poderia tomar ao contar sua história e as informações que tem do orfanato e daquele homem detestável. Também ele tinha um pouco de medo de que Brandon poderia ver ele um pouco diferente ao ouvir o que vai dizer. Ele se sentia culpado, embora soubesse que não deveria. E ter alguém que você estima dizer que você era, não é bom de se ouvir. 

"Então, vamos começar." Ferion falou. Sua voz tendo uma atitude firme. "Você queria falar algo na hora que estávamos na sala de recepção do orfanato, antes de sermos interrompidos."

"Sim, senhor." Nott balançou a cabeça. Seu cabelo agita um pouco.

"Tudo bem. Eu te chamei aqui para que você conte-nos o que queria dizer. Aparentemente é sobre o orfanato." 

"Está correto." Nott afirmou. "Senhor, eu me chamo Nott Zenkins e sou um cavaleiro há um ano de serviço no condado." Ele se apresentou, era importante para a outra parte saber quem relatava. "Quando era jovem, por volta dos meus catorze anos, fui adotado do orfanato por um soldado que me viu e decidiu que eu seria alguém bom para se ter como filho."

"O orfanato que fomos hoje?" Brandon indagou, observando seu amigo atentamente. 

"Sim." Nott o olhou, mas logo voltou a falar para Ferion, encarando suas orbes negras. "Eu fui levado para lá pelos meus oito anos, quando minha mãe morreu. Era um local bom e o pessoal era legal e simpatizava com as outras crianças. Não havia nada do que reclamar, já que tínhamos teto e comida todo o dia. Sabíamos que havia outros lugares que nem tinham isso direito."

"O antigo diretor era um sujeito gentil e sempre sorria para nós. Ele também se importava muito com as crianças e tratava a equipe como se fosse sua família. Ele era ocupado, mas tinha paciência e praticamente agia como um pai para todos nós." O cavaleiro pausou um pouco. "Porém, pouco depois de eu ter completado meus catorze anos, o diretor faleceu devido a uma doença que teve. Ele era velho e estava adoecendo várias vezes seguidas, com pouco intervalo de tempo. Não foi uma surpresa, mas ainda ficamos abalados quando o homem que nós vimos como um pai havia partido."

"Com a morte dele, foi decidido pelo governo que eles mandariam alguém "qualificado" para ser o novo diretor. Os funcionários que trabalhavam ali não tinham estudos e o local era de posse e mantido pelo governo. Não havia como impedir." O jovem falava com sua voz firme e clara. Tudo o que ele estava dizendo estava sendo ouvido por ambos, sem nenhuma interferencia. "Não demorou muito para que o homem encarregado do orfanato chegasse. Parece que o antigo diretor tinha suposto que sua hora estava chegando e que ele não duraria mais tanto tempo, então ele enviou um pedido e por isso não demorou muito a substituição e a chegada do homem."

"Só que, assim que ele se tornou o diretor oficialmente, ele demitiu os funcionários um por um, e começou a agir de maneira fria e grosseira. O diretor Ivor não nos maltratava, pois ainda havia funcionários e ele não podia demitir todos imediatamente." Nott soltou um suspiro. "Mas… Os castigos se tornaram um pouco mais pesados e o clima do orfanato ficou tenso. Todos estavam tomando mais cuidado para não pegar o lado ruim do diretor, mas acho que isso foi inútil, já que ele não parecia ter um lado bom, para começar."

Ferion não precisou perguntar a ele quem era o homem que havia substituído o antigo diretor. Ele sabia. O homem os atendeu na porta e os apresentou às crianças, era o mesmo homem que foi mandado pelo governo. A expressão de Nott tinha um descontentamento evidente e os olhos pingavam raiva. Ele reconheceu isso, pois via em algumas pessoas durante o tempo que esteve na guerra. 

"Quando o último funcionário que estava trabalhando teve que sair, foi como se nossa esperança tivesse acabado. Ele era o último que agia contra a política e a forma daquele homem de fazer as coisas. Ele também nos protegia algumas vezes. Era óbvio que não tinha ninguém do nosso lado naquele momento e só tínhamos uns aos outros." As mãos foram cerradas para as próximas palavras que tinham que ser ditas. "E foi quando sua tirania se tornou pior."

Um silêncio foi feito durante alguns instantes. Brandon e Ferion olharam para Nott que tinha um rosto retorcido em raiva pelo diretor do orfanato. Sua pele bronzeada pelo sol estava um pouco vermelha pelas suas emoções e por sua longa história que estava contando. Os dois estavam ouvindo sem sinais de demonstrar nenhum de seus pensamentos profundos. Era como se duas estátuas estivessem ouvindo, mas elas piscavam e eram feitas de carne e osso, não de pedras.

"O diretor começou a nos colocar em isolamento se fôssemos rebeldes e não dava comida durante algum tempo. Não podia todos, porque não havia salas o suficiente. Também houve agressões em alguns casos. Nos extremos, ele espancava tanto uma criança que ela desmaiou e teve que ser atendida por nós. Mas nenhuma delas ficava com risco de vida, parecia que ele sabia se controlar muito bem."

"E quando ia pessoas para adotar, geralmente ele combinava uma data para a visita. Era um tempo para ele parar as agressões e se concentrar nos convidados que estariam vindo. Nesses dias, todos se comportavam e respiravam de alívio por ter quem os visitasse, pois quem fosse punido ficaria dias em uma sala escura e sem comida, até que o dia da visita passasse."

Nott mordeu os lábios. Ele ainda podia ver a cena da sala escura e fedorenta que teve que passar seus dias, por causa que ele não concordou em fazer uma determinada tarefa. O homem se irritou tanto que o prendeu e o proibiu de sair. Ele tirou sua oportunidade de ser adotado e seu direito de comparecimento. Foi uma sorte ele ter sido adotado pelo soldado antes que algo pior tivesse acontecido consigo.

"E quando as pessoas não levavam ninguém, ele culpava as crianças e brigava, dizendo que fizeram algo errado ou foi culpa delas. É por isso, senhor, que eu acho que assim que saímos de lá, ele brigou com elas e, talvez, puniu algumas, para dar exemplo."

Ferion não disse nada quando o cavaleiro à sua frente terminou de falar. Ele batia os dedos na madeira e tinha uma mão em sua boca, com os lábios fechados. Brandon não sabia o que dizer ou se ele poderia dizer algo sobre o que ouviu. O ruivo não pensava que ouviria uma história que era pior do que ele imaginava. A história de Nott também não era boa, ele pensava que o mesmo havia vivido bem, pois disse que seu pai era um soldado em uma de suas conversas que tiveram, mas não imaginava que ele fosse órfão. 

O silêncio continuou naquela sala em que os três estavam. Cada um imerso em seus pensamentos sobre a história relatada e sobre a situação em questão.

Olá, meus leitores

Sobre esse cap: eu passo pano pro Nott e ele é cor de rosa ♪⁠ ⁠\⁠(⁠^⁠ω⁠^⁠\⁠ ⁠)

Só isso mesmo hehe

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Até logo. Abraços virtuais (⁠っ⁠.⁠❛⁠ ⁠ᴗ⁠ ⁠❛⁠.⁠)⁠っ

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